Este
foi o pior ano no crescimento dos repasses dos Fundo de Participação
dos Municípios (FPM) e de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Isto
aconteceu quando ocorreu o maior aumento da folha salarial da última
década ocasionado pelos reajustes do salário mínimo (de 14,13%) e do
piso do magistério (de 22,2%).
A constatação é do economista e consultor financeiro da Associação dos
Prefeitos do Estado do Ceará (Aprece), José Irineu de Carvalho. Ele diz
que a maioria dos prefeitos terá dificuldade de fechar as contas deste
ano, sem que sejam enquadrados na Lei de Responsabilidade Fiscal,
podendo responder por crime de improbidade administrativa.
Além da seca que penaliza os municípios e das redução nos repasses do
conjunto FPM e Fundeb, a crise nas cidades pequenas se agrava com o fato
de ser um final de mandato e, por isso, os gestores têm que quitar as
dívidas contraídas nos últimos oito meses, não podendo transferir restos
a pagar para os futuros sucessores.
"Este foi um ano péssimo para o gestor por se tratar de um ano
eleitoral, onde não pode ajustar a folha de pagamento com demissão de
empregados temporários e muito menos de concursados e efetivos", disse
Irineu.
Para o economista, a conjunção de fatores que comprometem o fechamento
das contas não poderia ter sido pior para quem encerra a gestão. Ele diz
que, no caso do pagamento da folha, houve um aumento que não resultou
da vontade propriamente dita do gestor, uma vez que boa parte está
atrelada ao salário mínimo e outra ao magistério. Esse, por sua vez,
representou numa elevação considerável em vista da lei do piso salarial,
que ampliou o quadro de professores, obrigando os municípios a
contratarem mais profissionais, a fim de adequarem o número de horas
trabalhadas do professor por aluno.
Impostos
Como o FPM tem por base a arrecadação do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI) e o Imposto de Renda, que tiveram,
respectivamente, isenção e redução no recolhimento por conta do fraco
crescimento industrial, houve um comprometimento do repasse do Fundo em
todo o País. No Brasil, a e expectativa é que houvesse um aumento
superior a 14%, enquanto que a realidade demonstrou não permitir um
índice superior a 2,33%.
Aparentemente, houve um crescimento dos repasses. Em 2010, foram
transferidos para os municípios cearenses R$ 1,69 bilhões. Em 2011, o
valor subiu para R$ 2,13 e este para R$ 2,18, considerando o período de
janeiro a outubro.
No entanto, houve mais um complicador que foi a inflação de 5,45% do
Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA). Enquanto isso, o
IPI teve uma queda na arrecadação, de 1,31%, e o Imposto de Renda, de
3,5%. O impacto dessa situação já se verifica no estágio de
desaceleração do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS). "Na verdade, o pior no repasse do FPM aconteceu em 2009. Mas
naquele ano, houve o socorro do Governo Federal com o apoio financeiro
aos municípios, compensando assim a queda. Além disso, o Fundeb teve um
aumento de 17% no repasse", disse Irineu.
Aprece
Para a presidente da Aprece, Eliene Brasileiro, além dos efeitos
econômicos causados negativamente pela seca e a redução nos repasses
constitucionais, há ainda para considerar que este é o último ano de
mandato. Com isso, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, o gestor não
pode deixar dívidas, o que se torna inevitável, segundo ela, quando as
receitas caem. "Pela legislação, as despesas com folha de pagamento de
pessoal não devem ultrapassar os 54% das receitas municipais. Isso faz
que com que na hora de fechamento das contas tenha que se fazer ajustes,
levando a demissões de terceirizados e no não pagamento dos cargos
comissionados", disse.
Eliene explica que é sempre penoso para o prefeito ter que demitir, mas
isso é uma situação extrema a fim de que suas contas não sejam
desaprovadas e resultem em enquadramento na Lei de Improbidade
Administrativa.
Para reverter o quadro, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM)
encaminhou um documento à ministra da Secretaria das Relações
Internacionais, Ideli Salvatti.
No documento, a entidade pede que seja dado um novo apoio financeiro aos
municípios e uma nova marcha no Distrito Federal está marcada para o
próximo dia 13, quando pretendem sensibilizar para tomadas de decisões a
curto prazo.
No documento, os prefeitos chamam a atenção para o fato de que o Governo
Federal adotou "uma série de políticas intituladas anticíclicas, que
promoveu isenções do IPI a vários setores da economia e que impactaram
negativamente as transferências de FPM; assim como, para evitar o
aumento dos combustíveis, adotou medidas que fizeram zerar a alíquota da
CIDE/Combustíveis, o que fez com que os municípios também deixassem de
receber as parcelas que têm direito pelo tributo.
O fato de que as demissões somente passaram a ser mais expressivas após
as eleições municipais não é bem explicado pela presidente da Aprece.
Ela diz não saber desde quando vinham se processando. No entanto, afirma
que, com o tempo, a crise mais se acentua e deixa os gestores sem saber
como enfrentar as dificuldades de caixa.
Corte de pessoal prejudica diplomação
Fortaleza Para
fechar as contas, muitas administrações estão recorrendo ao óbvio:
enxugar a folha de pagamento e não concluir as obras em andamento. No
entanto, José Irineu de Carvalho, que também presta consultoria
econômica para Prefeituras adverte: demissões sem critérios e o não
pagamento de obras contratadas há cerca de oito meses podem incorrem em
crime na Lei de Improbidade Administrativa. Pela lei, tanto não podem
ser demitidos os trabalhadores temporários e tampouco reduzida a jornada
de trabalho, uma vez que isso implica na mudança do contrato de
trabalho.
Irineu
de Carvalho diz que é difícil fechar as contas e não ser enquadrado na
lei da improbidade administrativa, quando há obras e folha a pagar Foto;
Natasha Mota
Os prefeitos somente podem, num ano eleitoral, demitir os terceirizados
ou mexer nos cargos comissionados. Essa situação deixa os gestores num
impasse, porque sem esses mecanismos ficam praticamente impossibilitados
de fechar as contas dentro do que preconiza a Lei de Responsabilidade
Fiscal.
Os casos de demissão de trabalhadores temporários, segundo Irineu, podem
comprometer a diplomação dos novos prefeitos, quer em caso de
reeleição, quer na eleição de correligionários. O economista observa que
se trata de um impedimento forte para equilibrar a folha de pagamento,
uma vez que a maioria da mão de obra dos municípios tem sido o emprego
temporário. Com relação às obras em andamento, também a legislação
determina que os gestores não devem deixar restos a pagar para os seus
sucessores, em contratos realizados de maio para cá.
"Com o aumento no salário mínimo e do magistério, não há como fechar as
contas diante da redução de receitas", observa o economista André
Carvalho. Ele diz que os impactos já são sentidos no setor de serviços,
onde se observa uma queda do recolhimento do ICMS.
Para a Aprece, os efeitos da crise que atinge os municípios brasileiros
podem ser percebidos, ainda, em outras áreas fundamentais, como o
financiamento da Educação, haja vista que a frustração das receitas, em
virtude da desaceleração da economia, vai impactar fortemente os
recursos do Fundeb.
Pleitos
Por isso, a presidente da Aprece, Eliene Brasileira, engrossa o coro da
CNM no sentido de que o Governo Federal seja sensível com os municípios
no sentido de repor os recursos desonerados do Imposto sobre o IPI para a
execução das políticas anticíclicas que reduziram o FPM em R$ 1,5
bilhão, bem como os recursos da Cide/Combustíveis destinados aos
municípios e que foram zerados através da decisão do próprio governo,
aproximadamente R$ 595 milhões.
Além disso, requer, dentre outras medidas, que proceda o imediato
pagamento dos restos a pagar, destinados aos municípios, das obras e
aquisições de equipamentos que já foram iniciadas ou adquiridas,
estimadas em R$ 8,2 bilhões.
Também pleiteia que se garanta a complementação da União ao Fundeb no
valor de R$ 10,4 bilhões, calculado com base na estimativa de
arrecadação, evitando ajustes em virtude das novas estimativas, e que o
valor desta complementação seja integral ainda no atual exercício
financeiro. Também reivindica que faça a reposição do aumento real do
salário mínimo que impactou em R$ 1,4 bilhão as folhas de pagamento dos
Municípios brasileiros.
Por parte dos parlamentares, a bancada nordestina defende uma negociação
com o governo, em função da fragilidade financeira por que passam os
municípios, em função da longa estiagem, que atinge a região. O
coordenador da bancada, deputado José Guimarães (PT-CE), informou que há
uma proposta de que os valores devidos não sejam cobrados nesse
momento. "Diante da situação nas nossas cidades, entendemos que esse
assunto deve ser tratado com um olhar, no mínimo, cuidadoso", afirmou.
Para os economistas Irineu e André essas medidas, se concretizadas,
serão significativas para aliviar o caixa das prefeituras. No entanto,
observam que a crise se deu no contexto da economia. "Não podemos
responsabilizar o IPI como o vilão na redução do FPM. Sua participação é
de apenas 14%, enquanto que os impostos representam 84%. Se o governo
está deixando de arrecadar mais é porque a economia não vai bem",
observa André.
MARCUS PEIXOTOREPÓRTER
Fonte: Diário do Nordeste
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